Sérgio Nabais
Advogado, João Nabais & Associados, Sociedade de Advogados, RL
De acordo com a Direcção-Geral da Saúde (DGS), entre 2013 e Junho de 2019, foram reportados 4893 casos de violência contra profissionais de saúde – dos quais 637 se verificaram no primeiro semestre de 2019.
Ainda de acordo com a DGS, essa violência abarca situações de assédio moral, violência verbal ou física e é, na maioria dos casos, levada a cabo por utentes ou seus familiares.
De uma perspectiva jurídica, essas situações podem corresponder à prática de crimes de injúria, difamação ou ofensas à integridade física (sempre agravados porque perpetrados contra funcionário no exercício de funções) ou, ainda, a crime de coacção sobre funcionário – com correspondente punição que vai desde pena de multa a pena de prisão até 12 anos (em casos de excepcional gravidade).
De uma perspectiva moral e social, a violência contra os profissionais de saúde tem tanto de incompreensível, como de inaceitável!
Não perdendo de vista que lidar com problemas de saúde, sejam próprios, sejam de familiares é, não raras vezes, bastante difícil, frustrante e mesmo revoltante, as situações de violência que, sobretudo nos últimos tempos, têm sido trazidas à praça pública deixam bem claro, na minha perspectiva, não só um crescente desrespeito generalizado em relação ao outro, mas, sobretudo, uma total incompreensão sobre a realidade daqueles que vivem para zelar pela nossa saúde.
É não compreender que os profissionais de saúde são, como todos nós, pessoas com dias melhores ou piores, que também têm os seus problemas pessoais e familiares…
É não compreender que esses profissionais trabalham, cada vez mais, no limite das suas capacidades físicas e psicológicas…
É não compreender que estão, também no exercício das suas profissões, sujeitos a regras e deveres que têm que observar e fazer respeitar…
E, julgo, à violência que se tem assistido contra este grupo de profissionais não tem sido alheio o deplorável tratamento mediático de situações como os tempos de espera, as próprias condições de funcionamento das unidades de saúde (em especial em alturas de maior afluência) ou situações de alegados erros cometidos – passando-se a ideia que, em boa parte, isso é da responsabilidade desses profissionais…
A isto acresce, infelizmente, a notória falta de apoio (prático, logístico, mesmo jurídico) das entidades públicas aos seus funcionários, abandonados à sua sorte e a terem que resolver e lidar sozinhos com as consequências da violência que sofrem…
A solução para o problema (ou, pelo menos, para o minorar) tem, necessariamente, que passar quer pela melhor formação dos profissionais de saúde para lidarem (no antes e durante) com este tipo de situações, quer pelo reforço da segurança nos locais de trabalho, quer pela melhoria das próprias condições de trabalho, quer pela maior celeridade e eficácia da punição, quer pela melhoria do acompanhamento dos profissionais que sejam vítimas de violência, mas, sobretudo, pela sensibilização da população em geral para esta problemática.
É que se queremos que continuem a tratar da nossa saúde e da dos nossos, não podemos continuar “a tratar da saúde” de quem o faz!